quarta-feira, 24 de março de 2010

Adoradores de cultos


Quando Jesus andou pela Palestina no século I da EC, Ele demonstrou com sua vida que o relacionamento que muitos procuravam ter com Deus estava equivocado. Dentre vários equívocos, destaca-se aquele que dizia respeito ao culto que se prestava ao Senhor.

Naquele tempo, homens de “bem” e de bens, saudáveis, da nacionalidade aprovada (israelita), de conduta “ilibada”, sem nenhuma restrição imputada pelos especialistas da religião, dirigiam-se ao Templo para cultuarem a Iahweh – possivelmente se ouvia por aquelas bandas dos santos homens: vou ao culto, vou a sinagoga, vou a “igreja”. A estrutura litúrgica, os cantos, as orações, os salmos, os gestos e as prédicas eram conhecidas e acatadas pelos fiéis judeus. Logo, este conforto litúrgico propiciava a sensação de trabalho cumprido com excelência. Afinal, criam que Deus gostava daquele culto porque os crentes se satisfaziam com o que faziam. É certo que crianças, mulheres, doentes e pobres não tinham acesso à área vip do local que se praticava a liturgia, mas não havia problema porque os homens de bem e de bens representavam no culto-lugar o que de melhor havia naquela Sociedade Eleita.

Todavia, eis que vem o subversivo Jesus Cristo e põe no chão a cristalização de formas cúlticas, relativiza o “espaço sagrado” do Templo, convida todas as pessoas a cultuarem, mostra que ninguém vai à “igreja” ou “sinagoga”, ironiza as formatações litúrgicas que adestram, castram e condicionam corações a entenderem que satisfação com o mecanismo cúltico é infinitamente maior que aprazer-se com o Deus do culto.

A igreja, ou “sinagoga”, é feita de pessoas transformadas por Jesus e não de tijolos e concreto. O culto é reconhecimento de que sem o Senhor nada se pode fazer. Cristo deixa claro que o templo de pedra é um local para cultuar. O mais importante Templo é o coração, este é o lugar do Sagrado, o solo santo. A isso se acrescenta que o culto verdadeiro se dá nas andanças da vida, nas palavras emitidas, nos pensamentos, nos atos exercidos. Portanto, o culto que se faz no templo de pedra nada mais é do que o encontro de uma comunidade de discípulos/as que cultuam ao Senhor dia-a-dia e que o farão em conjunto com os demais membros da família de Jesus.

A ordem perpetrada neste culto público não deve ser confundida com formatação ungida, santa e intocável. Para orar basta observar o roteiro básico apresentado por Jesus, para cantar basta que as palavras e sons provenham de um interior submisso e irrigado pela presença do Deus vivo, para batizar basta um ser quebrantado diante da face do Senhor e um copo de água ou um oceano inteiro, para que a Palavra edifique e faça diferença no cotidiano basta acolhe-la como revelação e traze-la para a vida sem legalismo, literalismo, hipocrisia, conservadorismo e fanatismo.

Segundo Jesus, não há gestos litúrgicos, formas e fórmulas rituais, roupas cúlticas, calendários, dialeto religioso mais santo e mais espiritual. Estes elementos devem apenas facilitar o culto público e não adquirir um fim em si mesmo a ponto de se tornar mais importante que Deus. Além disso, não existe sexo, status, raça e alguma outra distinção capazes de apontar os aptos e os inaptos para cultuarem. A aptidão é concedida àqueles que nada são, isto é, se reconhecem carentes da misericórdia, amor e Graça divina. Somente assim se cultua ao Senhor. Somente assim se conclui que Deus é a razão do culto e não as pessoas. Somente assim se anda com o Senhor, a saber, sem extravagâncias farisaicas, incredulidades sadoquitas, sem exageros rabínicos, sem pedigree místico.

Sem mais... cultuemos ao Senhor na liberdade do Evangelho.

Graça, paz e bem!