quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Livros & Revista em 2011

Este ano eu fiquei muito aquém daquilo que é o meu ideal para a leitura e estudo de livros. São muitas as desculpas que tenho para dar, mas deixemos isso de lado... Apesar de tudo, além da Bíblia que me acompanha cotidianamente, cito a você as obras que li e apreciei em 2011: 

Administração 
Aprendendo a lidar com pessoas difíceis – Rick Brinkman e Rick Kirshcner
Como administrar seu tempo – Marc Mancini
Como se tornar mais organizado e produtivo – Ken Zeigler
Networking: desenvolva sua carreira criando bons relacionamentos – Diane Darling
Os princípios de liderança de Jack Welch – Jeffrey Krames
Slide:ology – Nancy Duarte

Ciências Sociais 
A produção da crença – Pierre Bourdieu
Antropologia da cidade – Michel Agier
Manual de sociologia da religião – Roberto Cipriani
O peregrino e o convertido – Danièle Hervieu-Léger
Religião e cultura popular – Victor Valla
Religiões e cidades – Clara Mafra e Ronaldo Almeida
Uma breve história do Brasil – Mary Del Priore e Renato Venancio

Homilética 
Homilética: do púlpito ao ouvinte – Jilton Moraes
Manual de pregação – John Koessler
Sobre a preparação e a entrega de sermões – John Broadus

Igreja e Sociedade 
Clássicos devocionais – Richard Foster e James Smith
Educar e evangelizar na pós-modernidade – Ítalo Gastaldi
Forjando uma nova igreja – Clovis Castro e Magali Cunha
Igreja com propósitos – Rick Warren
Igreja onde estás? – Colin Williams
O caminho do discípulo – Caio Fabio
Por que você não quer mais ir à igreja? – Wayne Jacobsen e Dave Coleman
Reimaginando a igreja – Frank Viola
Sua igreja pode crescer – Guilhermino Cunha
Uma igreja de batizados – Rémi Parent

Revista 
Neste ano eu tive o prazer de conhecer e ler a excelente “Revista Sociologia” da Editora Escala. Trata-se de uma revista bimestral, escrita numa linguagem compreensível e com um preço (R$ 8,90) “acessível”. Vale à pena.

Que esta lista possa inspirá-los(as). 
Graça, paz e bem!

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Não negocie o Evangelho


Dia após dia os(as) discípulos(as) de Cristo são tentados(as) a fazerem concessões às propostas do mundo que os(as) descaracterizam e desonram a Deus. Batem à porta a injustiça, a incoerência, a infidelidade, a corrupção, a conquista a qualquer preço, a futilidade, a banalização, a distorção da prioridade, a leviandade e a idolatria. Nós como seguidores(as) de Jesus não podemos nos sujeitar a nenhuma dessas maldades.

Não vale à pena trocarmos a eternidade por um prato de lentilhas. Não vale à pena escaparmos da fornalha por momentos de adoração a homens e mulheres. Não vale à pena jogarmo-nos do alto de um templo com o intuito de tentar a Deus. Resistamos, pois seremos vencedores(as). Sejamos realmente fiéis, isto é, não negociemos os valores e princípios do Reino. Se quisermos integrar uma Igreja relevante para o século XXI, só façamos concessões ao amor.

Graça, paz e bem!

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

O trigo, o joio e a igreja






Quando pensamos naqueles(as) que integram a Igreja é comum cair na tentação de querer separar os(as) discípulos(as) de Cristo daqueles(as) que não o são. Dá vontade de mandar os(as) falsos(as) para o inferno com passagem só de ida. Dá vontade de entregar os(as) opositores(as) da Igreja para Satanás. Dá vontade de proclamar toda sorte de maldições sobre os(as) infiéis. Todavia, não é assim que se age.



Há alguns anos atrás, diante do anseio coletivo de separar os(as) seguidores(as) dos(as) demais, Jesus Cristo apresentou a parábola do Joio e do Trigo [Mateus 13.24-30]. O modo como o Senhor termina a sua reflexão é surpreendente: “Deixa-os crescer juntos até a colheita, e no tempo da colheita, direi aos ceifeiros: ajuntai primeiro o joio, atai-o em feixes para ser queimado; mas o trigo, recolhei-o no meu celeiro”.



É muito difícil aceitar esta ideia de Cristo. Tal dificuldade se complexifica quando vemos irmãos(ãs) fiéis sofrendo pelas investidas diabólicas dos(as) que estão travestidos(as) de cristãos(ãs). Em meio a tudo nós não podemos nos eximir da responsabilidade de manter o coração em Deus. Temos que denunciar os pecados cometidos, não se conformar com a maldade, não aceitar o mau testemunho, o desvio de conduta e nem o caráter dúbio.


O que fazer se estamos em meio a canalhas, levianos(as), lobos(as), hipócritas, traidores(as), maledicentes, maldosos(as) e egoístas? A dura e simples resposta é a seguinte: “Mostremos a eles(as) os seus pecados. Oremos por esses(as) que estão na Igreja há vários ou poucos anos, mas ainda não se entregaram a Cristo. Lembremo-nos que enquanto houver vida haverá oportunidade de conversão para quem ainda não está no Caminho”. 



Não percamos a nossa salvação por cinco minutos de insensatez e vingança. Deus conhece a nossa dor e sofrimento, portanto deixemos tudo nas mãos Daquele que nos salvou. Procuremos tão somente honrar a Deus em tudo, edificar a Igreja de Cristo com nossas palavras e atitudes, bem como anunciar o Evangelho às pessoas. 



Graça, paz e bem!

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Será que queremos uma reforma eclesial?


Reformar, em perspectiva cristã protestante, significa avaliar continuamente o quão próximos ou distantes de Jesus Cristo estamos para, em seqüência, buscar no Senhor a força necessária para empreender mudanças. Isto não tem nada a ver com formatos litúrgicos (na maioria dos casos tratam-se apenas de cosméticos “evangélicos”), mas sim com o caráter e integridade de quem abraçou o Evangelho.

Recentemente eu recebi um e-mail de um sr. chamado Mauricio José de Almeida Castro. Neste ele me perguntava muitas coisas a respeito de ser discípulo de Cristo. Ele me pareceu bastante confuso e inconformado com o meio cristão-evangélico. A síntese que apresentei a ele sobre o que eu acredito a respeito das Boas Novas talvez nos ajude a pensar sobre a Reforma:

“Se você conhece algum “cristão/ã” que mata em nome de Jesus, promove a guerra em nome de Jesus, divide pessoas, menospreza o sofrimento alheio, aliena-se e/ou omite-se ante as injustiças sociais, abstém de se relacionar e dialogar com as mais diversas pessoas, favorece os conflitos ao invés da construção da paz, desconsidera as culturas dos povos, também como prega e vive sem a convicção de que Cristo é o Caminho, a Verdade e a Vida esteja certo: não se trata de um/a discípulo/a de Jesus Cristo”.

Se pretendemos reformar a igreja é melhor inicialmente olhar para as breves considerações supraditas. Em seguida, ter coragem para pedir a ajuda de Deus para lutar pessoalmente contra o mal, transformar a mente e o coração e agir coerentemente. Ao mesmo tempo precisamos nos reunir como discípulos/as e lançar imediatamente no lixo tudo aquilo que nos desconfigura como Comunidade de Jesus Cristo.


Não enrolemos mais. Não precisamos nos reunir em assembléias, sínodos e concílios para verificar a possibilidade de reformar algo. Chega de besteiras. Cessem as burocracias (ou seria burro-cracias?). Unamo-nos para começar a reforma agora. Por amor a Deus, em nome de Cristo e no poder do Espírito Santo.

Graça, paz e bem!

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Tempo de silenciar


Uma importante disciplina espiritual é a busca pela solidão. Basta lembrar que Jesus após um período de muitas atividades e agitação “se retirava para lugares solitários, e orava” (Lucas 5.16).



A solitude é imprescindível para ouvir ao Senhor e colocar a “cabeça no lugar”. Quando os sons, os ruídos e os barulhos nos invadem ouvimos quase tudo... menos Deus. Equivocados nós chamamos muitas vezes o berreiro e o vozerio de Voz do Senhor, todavia não passa de vozes sem-Deus ou estampidos diabólicos.

Graça, paz e bem!

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Palavra: meditação e vida


“Lâmpada para os meus pés é a tua Palavra e, luz para os meus caminhos”. Salmo 119.105

Alguém que para e medita nas Escrituras Sagradas é alguém que se cuida. O(A) homem/mulher olha para o seu interior, confronta as suas descobertas íntimas com a Palavra de Deus. Neste confronto ele/a passa a entender as razões das suas tristezas, mágoas, incertezas e insucessos. Isso possibilita uma transformação das situações.

Quem busca esta meditação no Bom Ensino, cuida bem de si, recebe a ajuda do Senhor, dá menos ouvidos aos/às “palpiteiros/as” de plantão e tem condições de ser um bom suporte e uma boa influência para aqueles/as que estão próximos/as. Ele/a prefere receber o abraço e o sorriso de Deus a obter “tapinhas” nas costas de gente falsa.


Graça, paz e bem!

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Pensando no tom



Pare e pense um pouco:

Andando, aprendendo, dialogando e desfrutando da amizade de Jesus Cristo temos condições de dar o tom correto para as nossas necessidades pessoais (espiritualidade, comer, beber, dormir, higiene, lazer etc.) os relacionamentos (cônjuges, pais e filhos, familiares, igreja, amigos, sociedade), para os afazeres (estudo, trabalho), e para as demais coisas (terra, animais, plantas, recursos naturais, bens materiais, dinheiro, objetos).

Graça, paz e bem!

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Pelo em ovo








Nos tempos que antecederam a minha ida à Faculdade de Teologia e o ingresso no Ministério Pastoral a vida cristã parecia ser menos complicada. Lembro-me que eu ficava satisfeito com o modo como vivíamos o cristianismo, a saber, mantínhamos uma prática de oração e leitura bíblica diária, evangelizávamos pessoas que ainda não conheciam a Cristo, festejávamos as conversões que aconteciam, tínhamos amigos cristãos e não-cristãos, participávamos de vigílias, resolvíamos nossas pendências com diálogo e exercício do perdão, freqüentávamos acampamentos da igreja, expulsávamos o demônio de alguém quando necessário, íamos à Escola Dominical para estudar a Bíblia, procurávamos ser cheios do Espírito Santo, cultuávamos a Deus e nos reuníamos nas casas dos nossos irmãos para culto e confraternização. Tudo acontecia espontaneamente, sem imposições, era maravilhoso buscar a Deus... dava prazer estar com outros discípulos de Jesus.

Posteriormente, após um período de grande desenvolvimento e fecundidade terminei o meu curso teológico e iniciei o ministério pastoral (2001) com muitas expectativas boas. Desde este tempo até o presente ano a minha sensação é que o mundo virou, as igrejas se transformaram e eu cada vez mais me sinto um “peixe fora da água”. Hoje em dia parece que não basta cultuar, estudar as Escrituras, evangelizar, testemunhar, reunir-se com outros discípulos de Cristo, crer e confiar no poder de Deus, amparar o sofrido, esforçar-se por manter uma coerência entre vida e pregação. Na atualidade precisa ter uma campanha para alcançar qualquer coisa, quebrar uma maldição lá, agradar 100% os conservadores, os avivados e os liberais, fazer cafuné em algum crente perito em ser melindroso, ter um grupo de intercessão ativo durante o louvor comunitário para que dê tudo certo, dar respostas prontas e definitivas para crentes mal acostumados a pensarem e estudarem a Palavra, realizar um milagre aqui, entoar mais uma canção estranha que está nas paradas de sucesso, amarrar demônios inventados por gente que vê o Tinhoso em tudo, promover um congresso de prosperidade, participar de caríssimas conferências para alcançar uma santidade ainda maior, inscrever-se num evento de mistérios e revelações.

O Deus que é Pai, Filho e Espírito Santo não é mais suficiente em várias comunidades ditas cristãs. Temos um grupo considerável de insatisfeitos que precisam de alguma coisa nova para se motivar. Depois de 1997 o mundo evangélico que eu conhecia parece que gradativamente se torna menos cristão e mais complicado. Espero que essas minhas impressões sejam apenas o pensamento de alguém que está vendo “pelo em ovo”.

Graça, paz e bem!

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Deus é quem tece


Há dias atrás escutei numa canção a frase: “O que de mim aparece é o que dentro de mim Deus tece...”. Isso me fez rememorar a ação de Deus em minha vida. Ele é a fonte de todo bem. Ele é perfeito, justo e belo. Ele é quem imprime suas marcas em meu peito.

Se há qualidades em mim é porque minha comunhão com Este que é a Suprema Bondade transforma-me trazendo benefícios que eu posso compartilhar com outros. Deus me ensina com seus exemplos. A sua presença em meu coração me instiga a agir e pensar o mais parecido com Ele.

É certo que as minhas sombras não desapareceram por completo. Erros eu continuo a cometer. Certos pensamentos e atitudes que tomo ainda afrontam a Deus. Porém, muito do mal que outrora habitava em meu interior e se exteriorizava perdeu a sua força e influência. Deus me tem feito bem.

Vale à pena andar com Aquele que é o Caminho, a Verdade e a Vida. Vou sendo forjado como cidadão do Céu. Torno-me cada vez mais humano. Encontro Nele a força para prosseguir. Minha esperança vem Dele. Coisas boas se vêem em meu ser porque Deus as tece dentro em mim.

Graça, paz e bem!

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Uma matéria para ler, chorar e refletir







Amigos e amigas,

Aqui no blog eu costumo apenas indicar a leitura de textos. No entanto, peço-lhes que atentem-se a este divulgado na Revista Isto é. Quero lembrá-los que eu sou discípulo de Cristo, parte da igreja, comprometido com o Reino e chorei após ler esta matéria. Que Deus nos ajude em nossas limitações.

Graça, paz e bem!


N° Edição: 2170 | 10.Jun.11 – Revista Isto é
Os evangélicos e a ditadura militar

Documentos inéditos do projeto Brasil: Nunca Mais - até agora guardados no Exterior - chegam ao País e podem jogar luz sobre o comportamento dos evangélicos nos anos de chumbo

Rodrigo Cardoso

No primeiro dia foram oito horas de torturas patrocinadas por sete militares. Pau de arara, choque elétrico, cadeira do dragão e insultos, na tentativa de lhe quebrar a resistência física e moral. “Eu tinha muito medo do que ia sentir na pele, mas principalmente de não suportar e falar. Queriam que eu desse o nome de todos os meus amigos, endereços... Eu dizia: ‘Não posso fazer isso.’ Como eu poderia trazê-los para passar pelo que eu estava passando?” Foram mais de 20 dias de torturas a partir de 28 de fevereiro de 1970, nos porões do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), em São Paulo. O estudante de ciências sociais da Universidade de São Paulo (USP) Anivaldo Pereira Padilha, da Igreja Metodista do bairro da Luz, tinha 29 anos quando foi preso pelo temido órgão do Exército. Lá chegou a pensar em suicídio, com medo de trair os companheiros de igreja que comungavam de sua sede por justiça social. Mas o mineiro acredita piamente que conseguiu manter o silêncio, apesar das atrocidades que sofreu no corpo franzino, por causa da fé. A mesma crença que o manteve calado e o conduziu, depois de dez meses preso, para um exílio de 13 anos em países como Uruguai, Suíça e Estados Unidos levou vários evangélicos a colaborar com a máquina repressora da ditadura. Delatando irmãos de igreja, promovendo eventos em favor dos militares e até torturando. Os primeiros eram ecumênicos e promoviam ações sociais e os segundos eram herméticos e lutavam contra a ameaça comunista. Padilha foi um entre muitos que tombaram pelas mãos de religiosos protestantes.

O metodista só descobriu quem foram seus delatores há cinco anos, quando teve acesso a documentos do antigo Sistema Nacional de Informações: os irmãos José Sucasas Jr. e Isaías Fernandes Sucasas, pastor e bispo da Igreja Metodista, já falecidos, aos quais era subordinado em São Paulo. “Eu acreditava ser impossível que alguém que se dedica a ser padre ou pastor, cuja função é proteger suas ovelhas, pudesse dedurar alguém”, diz Padilha, que não chegou a se surpreender com a descoberta. “Seis meses antes de ser preso, achei na mesa do pastor José Sucasas uma carteirinha de informante do Dops”, afirma o altivo senhor de 71 anos, quatro filhos, entre eles Alexandre, atual ministro da Saúde da Presidência de Dilma Rousseff, que ele só conheceu aos 8 anos de idade. Padilha teve de deixar o País quando sua então mulher estava grávida do ministro. Grande parte dessa história será revolvida a partir da terça-feira 14, quando, na Procuradoria Regional da República, em São Paulo, acontecerá a repatriação das cópias do material do projeto Brasil: Nunca Mais. Maior registro histórico sobre a repressão e a tortura na ditadura militar (leia quadro na pág. 79), o material, nos anos 80, foi enviado para o Conselho Mundial de Igrejas (CMI), organização ecumênica com sede em Genebra, na Suíça, e para o Center for Research Libraries, em Chicago (EUA), como precaução, caso os documentos que serviam de base do trabalho realizado no Brasil caíssem nas mãos dos militares. De Chicago, virá um milhão de páginas microfilmadas referentes a depoimentos de presos nas auditorias militares, nomes de torturadores e tipos de tortura. A cereja do bolo, porém, chegará de Genebra – um material inédito composto por dez mil páginas com troca de correspondências entre o reverendo presbiteriano Jaime Wright (1927 – 1999) e o cardeal-arcebispo emérito de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns, que estavam à frente do Brasil: Nunca Mais, e as conversas que eles mantinham com o CMI.

Somente em 1968, quatro anos após a ascensão dos militares ao poder, o catolicismo começou a se distanciar daquele papel que tradicionalmente lhe cabia na legitimação da ordem político-econômica estabelecida. Foi aí, quando no Brasil religiosos dominicanos como Frei Betto passaram a ser perseguidos, que a Igreja assumiu posturas contrárias às ditaduras na maioria dos países latino-americanos. Os protestantes, por sua vez, antes mesmo de 1964, viveram uma espécie de golpe endógeno em suas denominações, perseguindo a juventude que caminhava na contramão da ortodoxia teológica. Em novembro de 1963, quatro meses antes de o marechal Humberto Castelo Branco assumir a Presidência, o líder batista carismático Enéas Tognini convocou milhares de evangélicos para um dia nacional de oração e jejum, para que Deus salvasse o País do perigo comunista. Aos 97 anos, o pastor Tognini segue acreditando que Deus, além de brasileiro, se tornou um anticomunista simpático ao movimento militar golpista. “Não me arrependo (de ter se alinhado ao discurso dos militares). Eles fizeram um bom trabalho, salvaram a Pátria do comunismo”, diz.

Assim, foi no exercício de sua fé que os evangélicos – que colaboraram ou foram perseguidos pelo regime – entraram na alça de mira dos militares (leia a movimentação histórica dos protestantes à pág. 80). Enquanto líderes conservadores propagavam o discurso da Guerra Fria em torno do medo do comunismo nos templos e recrutavam formadores de opinião, jovens batistas, metodistas e presbiterianos, principalmente, com ideias liberais eram interrogados, presos, torturados e mortos. “Fui expulso, com mais oito colegas, do Seminário Presbiteriano de Campinas, em 1962, porque o nosso discurso teológico de salvação das almas passava pela ética e a preocupação social”, diz o mineiro Zwinglio Mota Dias, 70 anos, pastor emérito da Igreja Presbiteriana Unida do Brasil, da Penha, no Rio de Janeiro. Antigo membro do Centro Ecumênico de Documentação e Informação (Cedi), que promovia reuniões para, entre outras ações, trocar informações sobre os companheiros que estavam sendo perseguidos, ele passou quase um mês preso no Doi-Codi carioca, em 1971. “Levei um pescoção, me ameaçavam mostrando gente torturada e davam choques em pessoas na minha frente”, conta o irmão do também presbiteriano Ivan Mota, preso e desaparecido desde 1971. Hoje professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, Dias lembra que, enquanto estava no Doi-Codi, militares enviaram observadores para a sua igreja, para analisar o comportamento dos fiéis.

Segundo Rubem Cesar Fernandes, 68 anos, antropólogo de origem presbiteriana, preso em 1962, antes do golpe, por participar de movimentos estudantis, os evangélicos carregam uma mancha em sua história por convidar a repressão a entrar na Igreja e perseguir os fiéis. “Os católicos não fizeram isso. Não é justificável usar o poder militar para prender irmãos”, diz ele, considerado “elemento perigoso” no templo que frequentava em Niterói (RJ). “Pastores fizeram uma lista com 40 nomes e entregaram aos militares. Um almirante que vivia na igreja achava que tinha o dever de me prender. Não me encontrou porque eu estava escondido e, depois, fui para o exílio”, conta o hoje diretor da ONG Viva Rio.

O protestantismo histórico no Brasil também registra um alto grau de envolvimento de suas lideranças com a repressão. Em sua tese de pós-graduação, defendida na Universidade Metodista de São Paulo (Umesp), Daniel Augusto Schmidt teve acesso ao diário do irmão de José, um dos delatores de Anivaldo Padilha, o bispo Isaías. Na folha relativa a 25 de março de 1969, o líder metodista escreveu: “Eu e o reverendo Sucasas fomos até o quartel do Dops. Conseguimos o que queríamos, de maneira que recebemos o documento que nos habilita aos serviços secretos dessa organização nacional da alta polícia do Brasil.” Dono de uma empresa de consultoria em Porto Alegre, Isaías Sucasas Jr., 69 anos, desconhecia a história da prisão de Padilha e não acredita que seu pai fora informante do Dops. “Como o papai iria mentir se o cara fosse comunista? Isso não é delatar, mas uma resposta correta a uma pergunta feita a ele por autoridades”, diz. “Nunca o papai iria dedar um membro da igreja, se soubesse que havia essas coisas (torturas).” Em 28 de agosto de 1969, um exemplar da primeira edição do jornal “Unidade III”, editado pelo pai do ministro da Saúde, foi encaminhado ao Dops. Na primeira página, há uma anotação: “É preciso ‘apertar’ os jovens que respondem por este jornal e exigir a documentação de seu registro porque é de âmbito nacional e subversivo.” Sobrinho do pastor José, o advogado José Sucasas Hubaix, que mora em Além Paraíba (MG), conta que defendeu muitos perseguidos políticos durante a ditadura e não sabia que o tio havia delatado um metodista. “Estou decepcionado. Sabia que alguns evangélicos não faziam oposição aos militares, mas daí a entregar um irmão de fé é uma grande diferença.”

Nenhum religioso, porém, parece superar a obediência canina ao regime militar do pastor batista Roberto Pontuschka, capelão do Exército que à noite torturava os presos e de dia visitava celas distribuindo o “Novo Testamento”. O teólogo Leonildo Silveira Campos, que era seminarista na Igreja Presbiteriana Independente e ficou dez dias encarcerado nas dependências da Operação Bandeirante (Oban), em São Paulo, em 1969, não esquece o modus operandi de Pontuschka. “Um dia bateram na cela: ‘Quem é o seminarista que está aqui?’”, conta ele, 21 anos à época. “De terno e gravata, ele se apresentou como capelão e disse que trazia uma “Bíblia” para eu ler para os comunistas f.d.p. e tentar converter alguém.” O capelão chegou a ser questionado por um encarcerado se não tinha vergonha de torturar e tentar evangelizar. Como resposta, o pastor batista afirmou, apontando para uma pistola debaixo do paletó: “Para os que desejam se converter, eu tenho a palavra de Deus. Para quem não quiser, há outras alternativas.” Segundo o professor Maurício Nacib Pontuschka, da Pontifícia Universidade Católica (PUC), de São Paulo, seu tio, o pastor-torturador, está vivo, mas os dois não têm contato. O sobrinho também não tinha conhecimento das histórias escabrosas do parente. “É assustador. Abomino tortura, vai contra tudo o que ensino no dia a dia”, afirma. “É triste ficar sabendo que um familiar fez coisas horríveis como essa.”

Professor de sociologia da religião na Umesp, Campos, 64 anos, tem uma marca de queimadura no polegar e no indicador da mão esquerda produzida por descargas elétricas. “Enrolavam fios na nossa mão e descarregavam eletricidade”, conta. Uma carta escrita por ele a um amigo, na qual relata a sua participação em movimentos estudantis, o levou à prisão. “Fui acordado à 1h por uma metralhadora encostada na barriga.” Solto por falta de provas, foi tachado de subversivo e perdeu o emprego em um banco. A assistente social e professora aposentada Tomiko Born, 79 anos, ligada a movimentos estudantis cristãos, também acredita que pode ter sido demitida por conta de sua ideologia. Em meados dos anos 60, Tomiko, que pertencia à Igreja Evangélica Holiness do Brasil, fundada pelo pai dela e outros imigrantes japoneses, participou de algumas reuniões ecumênicas no Exterior. Em 1970, de volta ao Brasil, foi acusada de pertencer a movimentos subversivos internacionais pelo presidente da Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor, onde trabalhava. Não foi presa, mas conviveu com o fantasma do aparelho repressor. “Meu pesadelo era que o meu nome estivesse no caderninho de endereço de alguma pessoa presa”, conta.

Parte da história desses cristãos aterrissará no Brasil na terça-feira 14, emaranhada no mais de um milhão de páginas do Projeto Brasil: Nunca Mais repatriadas pelo Conselho Mundial de Igrejas. Não que algum deles tenha conseguido esquecer, durante um dia sequer, aqueles anos tão intensos, de picos de utopia e desespero, sustentados pela fé que muitos ainda nutrem. Para seguir em frente, Anivaldo Padilha trilhou o caminho do perdão – tanto dos delatores quanto dos torturadores. Em 1983, ele encontrou um de seus torturadores em um baile de Carnaval. “Você quis me matar, seu f.d.p., mas eu estou vivo aqui”, pensou, antes de virar as costas. Enquanto o mineiro, que colabora com uma entidade ecumênica focada na defesa de direitos, cutuca suas memórias, uma lágrima desce do lado direito de seu rosto e, depois de enxuta, dá vez para outra, no esquerdo. Um choro tão contido e vívido quanto suas lembranças e sua dor.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Coração Aquecido & Dia do Café

Hoje eu comemoro o dia que o meu coração se aqueceu pela minha esposa em 1998.

Neste dia comemora-se, também, a experiência de John Wesley. Ele sentiu o seu coração se aquecer por Deus e pela Missão Cristã.

Outra comemoração marcante é o Dia Nacional do Café.

É... hoje o meu coração está ainda mais aquecido por minha esposa, por Deus, pela Missão Cristã e por esta deliciosa bebida chamada Café.

Café combina com leitura, música, reflexão, diálogo, namoro, trabalho, estudo, academia, lazer, compras, banho, viagem, relaxamento...

Os donos de empresas que comercializam o café devem estar vibrando com esta minha declaração.

De qualquer forma eu agradeço a Deus pelo café...

Mais tarde eu sairei com minha mulher para tomarmos um café juntos.

Graça, paz e bem!

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Nada te turbe, nada te espante

"Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim." [João 14.27]

Você já deve ter visto um turbante. Se ainda não, pense numa cobertura de cabeça feita com um longo pedaço de pano enrolado ao redor do crânio. Quando o turbante é bem colocado nem mesmo movimentos bruscos conseguem arrancá-lo. Ele fica ali parado como se fosse parte da cabeça. Todos o notam.

Quando você procura saber qual a ideia que Jesus queria transmitir com o verbo turbar (tarasso), a imagem do turbante ajuda na compreensão. Turbar é deixar-se ser envolvido por algo exterior. Mas o detalhe é que aquilo que toca o ser humano provindo do exterior se instala no interior causando agitação, distúrbios, tumultos e confusões.

No capítulo 14 de João está evidente que a causa das turbulências no coração dos discípulos é a traição de Judas, a partida de Jesus e a negação de Pedro. Todas aquelas ocorrências se realizando quase ao mesmo tempo tira os seguidores de Cristo do eixo e causa neles um mal-estar terrível. Porque turbar não significa apenas que o turbante lhe apertou a cabeça por alguns segundos e em seqüência encaixou-se adequadamente. Turbar é abalar de fato, é ficar sem rumo, afundar na dor experimentada e perder quase toda a esperança.

Quando Jesus conversa com os seus companheiros de caminhada o seu intento é mostrar-lhes que é necessário permitirem-se envolver pelo turbante da fé em Deus e em Cristo. Os corações dos discípulos estavam turbados pelas dores da vida, pela insegurança, pela falta de perspectiva, pelo medo de que o sonho concretizado se esvaia.

A solução para que os seguidores de Cristo deixem de ser corroídos pelas suas dores é olharem para Deus. Amparados pelo Senhor eles permanecerão firmes apesar dos abalos. Era momento deles saberem que as amarguras, as derrotas e os desencontros são próprios desta vida.

Os problemas financeiros, as doenças, os temores e as ausências vêm e muitas vezes estas dificuldades são vencidas rapidamente pela manifestação do poder de Deus. Mas há vezes que os fatos externos vêm e causam desconforto pelo longo tempo que demandam para serem resolvidos. E nestas ocasiões não dá para se abalar. É urgente encarar os dilemas.

As aflições são próprias deste mundo, no entanto os seus olhos precisam fixar-se no céu, enchendo-lhe de esperança para suportar o dia mal com o pé na terra e seguro por Deus. Crer na Trindade implica em não tirá-la do foco, não se deixar consumir pelos percalços e pecados contra o Senhor e o seu próximo. É preciso lançar-se nas mãos do Pai Celeste a fim de que Ele o sustente.

Jesus Cristo é a segurança do discípulo. Vale à pena envolver-se pelo turbante da fé no Senhor. Algumas derrotas serão inevitáveis na caminhada, mas as vitórias serão muitas. E a maior delas é encontrar-se com o Autor e Consumador da sua fé na Glória Celestial, no Céu, no Reino de Deus.

Graça, paz e bem!

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Um pedido de oração





Você que tem acompanhado este blog nestes cinco anos já percebeu que eu não trato de assuntos relacionados à minha instituição religiosa, a saber, a Igreja Metodista. O meu foco até então foi a reflexão bíblico-teológico-pastoral. No entanto, eu quero abrir uma exceção hoje.

No mês de julho haverá um Concílio Geral que reúne clérigos e leigos como representantes da Igreja Metodista espalhada no território nacional brasileiro. Neste conclave serão discutidos temas importantes e serão definidos os próximos passos da caminhada.

No passado os olhares se voltavam especialmente para a corrida episcopal e a eleição dos/as bispos/as. Não se discutia o chamado, a competência e os requisitos para o exercício deste Ministério Episcopal temporário, apenas “abria-se a porteira e os bois mais fortes, influentes e rápidos venciam”. Assim, perdia o Reino e a Igreja.

Outros assuntos que gravitavam em torno deste último era o preenchimento dos altos cargos de poder e as questões administrativas e jurídicas (tomando aproximadamente 95% do tempo conciliar). E, para excitar os ânimos, encaixavam-se debates sobre temas como ecumenismo e maçonaria.

Eu gostaria que você se juntasse a mim para clamar a Deus em prol deste encontro. A minha oração é para que, desta vez, os conciliares ocupem-se mais e tomem decisões relacionadas à fidelidade a Cristo, às doutrinas bíblicas em perspectiva metodista, a evangelização, a educação cristã, a devoção, a música, o discipulado, a espiritualidade cristã, a dinamização do trabalho missionário das igrejas locais, a plantação de igrejas, o engajamento social pela via do Evangelho e os desafios da(s) cultura(s) contemporânea(s).

Peço-lhe desculpas por essa solicitação para orar e espero não ter que enfadar você novamente com assuntos da minha instituição.

Graça, paz e bem!

domingo, 27 de março de 2011

José Comblin: 1923-2011

O mundo cristão perde um grande teólogo, o irmão José Comblin, aos 88 anos. Ele nasceu em Bruxelas, Bélgica, em 1923. Viveu no Brasil entre os anos 1958 a 1971, e 1980 a 2011.

Inúmeras são as suas contribuições para a Teologia Sistemática, a Teologia Bíblica e a Teologia Prática. Dentre suas muitas obras eu destaco: “A força da Palavra”; “Viver na cidade: pistas para a pastoral urbana”; “Desafios dos cristãos do século XXI”; “Os desafios da cidade no século XXI”; “Pastoral urbana: desafios na evangelização”; “O Caminho: ensaio sobre o seguimento de Jesus”.

Que Deus conforte todos os familiares, irmãos e amigos.

Graça, paz e bem!

segunda-feira, 21 de março de 2011

Bíblia e Culto: prevenção e alento nas tragédias

Porque de Deus somos cooperadores; lavoura de Deus, edifício de Deus sois vós. [1 Coríntios 3.9]

Guerras, rumores de guerras, nuvens radioativas, tsunamis, catástrofes... A vida segue um curso estranho. Desastres acontecem, sempre aconteceram e acontecerão. No passado uma calamidade somente era conhecida pelas pessoas ligadas a ela. Atualmente, com o avanço dos meios de comunicação, as informações sobre tais ocorrências são veiculadas para o mundo todo.

Não bastassem as tragédias pessoais de cada dia, a estas são agregados os dramas do planeta inteiro. Os dilemas de cada um/a acabam doendo e incomodando mais do que outrora. Para piorar, o individualismo democratizado força as pessoas a zelarem exclusivamente pelos seus sofrimentos. Elas ficam cegas a ponto de não verem as suas contribuições para a concretização ou agravamento do caos: poluem, destroem, exploram, abusam e descartam.

Não obstante, Deus levantou um povo capaz de frear os vários patrocinadores da morte e da desordem planetárias. Trata-se do povo cristão. Aquele que se relaciona com Deus Pai, é discípulo de Jesus Cristo e cheio do Espírito Santo. Esta gente de propriedade exclusiva do Senhor foi chamada a abençoar todas as populações da terra, administrar bem o Jardim e amar o semelhante para a glória do Altíssimo.

Pelo que se lê nas Escrituras a cristandade demonstra em sua espiritualidade uma forma de ser e agir que reflete Aquele que a chamou das trevas para sua maravilhosa luz. A maneira como ela se relaciona com Deus, estuda a Bíblia e cultua ao Senhor se concretizam no seu compromisso com os/as semelhantes e sociedades. Resumindo, a vida de cada cristão/ã é um farol para pessoas que habitam em trevas.

Em oposição àqueles/as que se lançaram ao discipulado cristão, há homens/mulheres que se desviaram do Caminho. Estes/as alimentam-se de si mesmos/as; embriagam-se e extasiam-se com suas alegrias e sofrimentos como se fossem o centro ou o fim de tudo; cultuam seus cultos e celebram uma Bíblia que as serve; mas não assumem que para o/a discípulo/a “o viver é Cristo e o morrer é lucro”.

Verdade seja dita: se fossem mais de Jesus Cristo e menos de si mesmos/as e de uma religiosidade falsamente chamada “cristã” muita coisa seria diferente. Apesar de tudo, este quadro pode ser revertido, há solução, existe esperança. E para que isso se concretize é imprescindível voltar cuidadosamente os olhos e o coração para a Escritura. Através dela se conhece a Palavra que areja, transforma, anima, fortalece, acalenta e motiva.

Aprende-se na Bíblia sobre o relacionamento com Deus e como cultuá-lo em espírito e em verdade. Nota-se que cultuar ao Senhor dentro ou fora do templo é urgente. À medida que o/a cristão/ã se lança ao estudo profundo das Escrituras, a Palavra é arraigada no fundo do peito e o culto brota de um interior cheio de Deus. O mundo inteiro nota, a vida é gradativamente transformada e as trevas são dissipadas. Agem para si e para além de si em honra Daquele que os libertou, salvou e preparou-lhes lugar na eternidade.

Se você quer saber mais como integrar este povo que pensa e age conforme o Evangelho, Deus lhe convida a se aproximar, ler e estudar a Bíblia. O Senhor lhe garante que em meio aos desastres da vida Ele não lhe faltará. Além disso, você será agente de transformação no mundo de modo que muitos desastres serão evitados ou amenizados. Eis o desafio: permaneça no Caminho e aprofunde-se no conhecimento da Palavra a fim de que toda a sua existência seja um culto ao Senhor.

Graça, paz e bem!

sábado, 5 de março de 2011

Tanto gasto

Diante da bênção que é o Evangelho libertador e salvífico tenho pensado:



Quanta energia, criatividade, tempo, sono, dinheiro e reflexão eu gastei à toa! Por quê? Para quê?



Graça, paz e bem!

sexta-feira, 4 de março de 2011

10 anos

Hoje eu acordei invadido pela célebre frase de John Wesley: "Dá-me cem homens que nada temam senão o pecado, e que nada desejam senão a Deus, e eu abalarei o mundo."

Depois de refletir sobre este pensamento e considerar a vida ao meu redor... pensei rápido, alto e sem tantos pudores: No momento se eu tivesse cem irmãos e amigos para compartilhar do Evangelho, tão somente do Evangelho, nada mais do que o Evangelho e das alegrias que Ele gratuitamente confere a nós e a outros... seria tão bom.

Desculpe-me, mas hoje estou carente de gente de Deus, humana (perdão pela redundância), transformada, em transformação, evangelizada, pacificada, vivendo pelo Evangelho, existindo no Evangelho, sensível ao Espírito Santo, aberta aos semelhantes, sem jogos, sem lobbies dia-bólicos, sem melindres, sem frescuras e sem azedumes.

Não fique preocupado comigo e nem tire conclusões precipitadas a meu respeito. Saiba que após completar dez anos de ministério pastoral, como faço de tempos em tempos, estou em processo de avaliação da caminhada até aqui. De repente o meu “pensamento alto” foi apenas um extrapolo, um desatino, um surto, ou não.

Graça, paz e bem!

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Tradição de Cristo & Tradições eclesiásticas

A transmissão do conjunto de valores e práticas estabelecidas é chamada tradição. Esta é sedimentada com o passar dos anos no interior dos grupos humanos. As tradições são variadas. Como exemplo, elas são compostas por cosmovisões, pareceres, costumes, crenças e informações relacionadas à religião, a moral, a vida social, a profissões, a conhecimentos técnicos etc.

No que tange à “religião cristã” também é possível falar em tradição e/ou tradições. A figura central do cristianismo é Jesus Cristo. Uma vez que Ele é Senhor e Salvador, os seus valores, práticas e reflexões formam a tradição que deverá ser observada pelos/as seus/suas discípulos/as.

O modo de ser de Jesus é mais bem compreendido nos relatos dos evangelistas bíblicos intitulados como Marcos, Mateus, Lucas e João. Todavia, o Filho do Altíssimo também valoriza e reproduz a tradição espiritual formada nos anos anteriores ao seu nascimento por homens e mulheres que se relacionaram com Deus.

Na tradição do Senhor vários elementos do Primeiro Testamento são retomados, algumas novidades são inseridas e uma nova maneira de interpretar a existência é apresentada. Para exemplificar, na práxis de Cristo identificamos a valorização de uma concepção de vivência devocional anterior à monarquia e ao templo do ano 1000 a.C.

Ainda pensando neste exemplo, Jesus retoma-o e o torna mais abrangente. A vida devocional não mais se restringe ao estudo e meditação das Escrituras, à oração, ao jejum e ao culto comunitário no templo. Por isso, a adoração, o louvor e a reverência ocorrem em qualquer espaço. O modo como os/as discípulos/as trabalham, estudam e se relacionam indicam ou não a comunhão destes/as com Deus.

A tradição de Cristo composta por palavras, ações, análises, visões e valores é quem direciona toda a jornada da Igreja. Ela orienta toda a vida dos/as seus/suas seguidores/as. Outras tradições podem ser mantidas, transformadas ou deixadas de lado. Na tradição do Senhor isso não pode ser feito. Esta os/as cristãos/ãs não negociam de forma alguma, antes procuram compreende-la cada vez mais se valendo das experiências com o Senhor e das pesquisas teológicas e históricas sobre Jesus Cristo.

No cristianismo, os costumes, os hábitos, as estruturas organizacionais, as formas litúrgicas comunitárias das igrejas espalhadas pelo mundo mudam segundo as culturas, os tempos e as novas demandas. Estes elementos secundários, muitas vezes erroneamente “sacralizados” e agregados à tradição de Jesus, têm prazo de validade. Eles não têm o mesmo peso que a ética e a salvação de Cristo.

Não obstante, as confrarias têm as suas tradições para além da tradição de Jesus. Como exemplo, destaco as igrejas Anglicana, Assembléia de Deus, Batista, Congregacional, Luterana, Metodista e Presbiteriana. Estas comunidades cristãs embora procurem ser fiéis a Cristo tem as suas tradições, isto é, suas ênfases, seus costumes e suas características.

Desde que não agridam nem enclausurem o Evangelho, que é Jesus Cristo, estas tradições podem ser afirmadas. Mas é preciso avaliar de tempos em tempos se não existem aspectos destas que precisam ser abandonados, desenvolvidos ou reformulados em decorrência das transformações sócio-culturais. Isto é urgente, pois a Igreja tem a tarefa de viver e anunciar o Reino de Deus às pessoas em seus contextos.

Jesus Cristo tem supremacia sobre todas as tradições eclesiásticas e pessoais. Convertamo-nos, pois, diariamente ao Senhor.

Graça, paz e bem!

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Uma Igreja relevante

Eu gosto de ler e refletir sobre as narrativas dos evangelistas bíblicos a respeito da maneira como Jesus Cristo vivia, demonstrava e anunciava a Boa Notícia aos diversos grupos sociais. Ele se esmerava em falar sobre as coisas de Deus respeitando a realidade dos homens e das mulheres que se punham a ouvi-lo. A linguagem e os exemplos utilizados por Ele faziam todo o sentido para aqueles que estavam ao seu redor.

O Mestre se valia dos recursos didáticos da época. O seu ensino era marcado por histórias, exemplos, parábolas e metáforas. Aliás, não podia ser diferente disso se de fato quisesse ser compreendido. Cristo não abria mão dos fundamentos espirituais e por isso se relacionava com todos sem medo. Esta postura fez com que Jesus fosse alvo de comentários maldosos estrategicamente pensados como: comilão; beberrão; amigo de arruaceiros, pobres, prostitutas, publicanos, doentes, vagabundos; etc.

A mensagem e os atos de Jesus eram adequados à realidade das pessoas do primeiro século. Tamanha adequação fez com que políticos e religiosos daquela época o odiassem e tramassem o seu assassinato. Por outro lado, crianças, mulheres, analfabetos, intelectuais, pescadores, artesãos, roceiros, comerciantes, pobres, ricos, descrentes e religiosos ao experimentarem a libertação, o perdão e a salvação de Jesus passavam a amá-lo e segui-lo.

Posteriormente, após a ressurreição, o Espírito Santo continua atualizando a mensagem cristã, falando às pessoas em seus contextos e suscitando líderes que estejam firmados no Evangelho, sejam sensíveis à Sua voz, procurem atualizar a Mensagem para a contemporaneidade, confiem na obra salvífica do Senhor, dêem respostas cristãs às demandas das pessoas que vivem no século XXI e ajudem homens e mulheres a transformarem a Boa Notícia em atos concretos.

Ao olhar para todas as palavras e ações do Deus Trino na Bíblia concluo que Ele respeitou a existência e a cultura de cada um dos seus servos. O Senhor esperava a melhor hora para agir, escolhia as palavras certas e dava exemplos precisos por amor. Posso afirmar que Ele foi e continua sendo um exímio hermeneuta.

Para que uma igreja seja relevante para o seu contexto é de suma importância firmar-se no Evangelho, ousar dialogar com a realidade e adequar-se à cultura das pessoas que serão evangelizadas. Para tanto, a comunidade cristã não pode se fechar em seus modelos litúrgicos, em seus preconceitos, em suas formas administrativas, em suas burocracias, em seus tradicionalismos e em seus misticismos.

Apesar da existência de grupos cristãos que se fecharam a ponto de enrijecer-se e rechaçar a realidade social e outros que trocaram o Evangelho por um “Jesus” pós-capitalista, golpista e “desatador de nós”, a Igreja de Jesus Cristo não pode se curvar a estas posturas. A Igreja tem que levar a sério o lema da Reforma Protestante: “Igreja reformada sempre reformando”.

Que Deus ajude a mim e a você a encarar o mundo atual e a servi-lo segundo os valores do Evangelho.

Graça, paz e bem!

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Arte e libertação?

Fui seduzido pelo artigo com o título “Arte e Libertação” e acessei o link. O site pareceu-me interessante "Cristianismo Criativo" e o artigo "Arte e Libertação" também. A Revista Eletrônica é, de modo geral, boa, mas o artigo...

Eu li o artigo e não consegui contemplar a tal criatividade cristã no texto. Pareceu-me uma colcha de retalhos com uma suposta denúncia-clichê de alguém que se pretende criativo. Ao contrário da maestria de teólogos como Bonhoeffer e Tillich que dialogavam teologicamente com as mais variadas áreas do saber humano, este artigo fez misturas horríveis. Se eu fosse um esteta pós-moderno talvez apreciasse o texto.



Em linhas gerais:



1) Ficou faltando destacar quais são os clichês que são tão problemáticos. Se o clichê é não ter clichê, então está criado mais um clichê.



2) Também faltou clareza sobre o significado de “novas liturgias”, pois, em perspectiva bíblica, liturgia não é apenas culto. Outro aspecto a este relacionado é a “liturgia como formação e modelagem da subjetividade”. Existe alguma liturgia que não seja reflexo de alguma teologia e vice-versa? Será que as liturgias não são modeladas, modelagens e meios de modelagem? Retomando o saudoso Pierre Bourdieu, será que cada liturgia não reflete um habitus cultural e, ao mesmo, o reafirma e reinterpreta-o?



3) Com relação à interação cultural da parte do/a cristão/ã, citada no artigo, é óbvia esta necessidade. Mesmo porque a espiritualidade apresentada por Cristo é um mix entre vida piedosa e ação em prol do/a outro/a. Ser criativo/a, observando esta compreensão, é saber harmonizar as duas partes supracitadas.



4) Algo, que não é tão criativo e ecoou clichê, se refere à participação nas rodas de samba burguesas mencionadas no texto. Não adianta censurar a ausência da igreja em espaços humanos como o destacado, se não houver reformulação nos conteúdos, metodologias e formas utilizadas na educação cristã de uma igreja local. Tampouco vale a censura se não há disposição, empenho e trabalho com vistas a algo diferente.



Uma vez que a “Cristianismo Criativo” não é uma Revista Acadêmica, antes lida por muitas pessoas “leigas” nas reflexões teológicas científicas, o/a escritor/a tem que facilitar a vida do/a leitor/a. Por isso, para se aventurar a colocar um artigo desta magnitude numa Revista Popular é preciso muita sensibilidade e respeito por quem a lê. Assim, observe o que seria oportuno esmiuçar neste artigo:



1) as diferenças entre Teologia Cotidiana e Teologia Acadêmica, pontuar as contribuições de ambas e propor o fim do embate entre as duas Teologias.



2) os diversos sentidos do termo “liturgia” e pontuar que o uso feito no artigo se refere ao “culto espiritual”.



3) os significados da expressão “pregação” e indicar que a mesma será utilizada com o sentido de “sermão”.



4) o que significa “clichê”, quem considera um “clichê” clichê (questão de poder) e quais são os clichês problemáticos e por quais motivos.



5) a diferença entre “música-de-crente” e “música-que-não-é-de-crente”, porque foi criada tal distinção, e avaliar se existe alguma distinção.



6) o significado de arte (produção cultural), destacar as formas de arte (a escultura, a pintura, o teatro, o cinema, a literatura, a música), explicar do ponto de vista histórico-social e teológico o problema criado pelo protestantismo com relação às expressões artísticas.



7) o uso de ideias, conceitos, teses de pensadores/as, cantores/as e compositores/as que não fazem parte do ambiente cristão; até onde podemos usá-los; os limites do uso.



8) o motivo pelo qual não se pode usar Bonhoeffer e Vattimo nos espaços educacionais da igreja (aula na Escola Dominical, Sermão, Estudos Bíblicos, encontros de Discipulado etc); destacar quem são as pessoas que acham estes teólogos tão ameaçadores e os motivos.



9) as razões que fizeram com que o templo da Igreja Ortodoxa seja menos freqüentado do que o salão de festas desta comunidade cristã.



10) as diferenças entre uma linguagem religiosa e outra arreligiosa.



11) as motivações para uma distinção “judaico-cristã” entre sagrado e profano, bem como a postura de Jesus Cristo com relação a este tema.



12) a necessidade de “recriar símbolos, mitos, metáforas e ritos , associando práticas de alteridade radical a elas. Não só no campo da cultura, mas também nos campos da política e economia.” E pontuar qual a relação entre as bases da ciência (epistemologia) e o tema em discussão.



13) os ritos de catarse que as comunidades cristãs carecem ou não.



14) o que tem desumanizado as comunidades cristãs.



Muita coisa ainda poderia ser questionada, porém para isso não virar uma Banca de Doutorado...  podemos parar por aqui.



Se alguém quer escrever numa revista "não-científica" para cristãos/ãs, deve arcar com a responsabilidade de explicar quantas vezes for necessário. Ninguém que "visita" a "Cristianismo Criativo" é obrigado/a a saber de toda a discussão acadêmica teológica que existe. Se o/a escritor/a está investido/a de poder para escrever, que o faça com amor, didática, pedagogia etc.



O texto é clichê e, dependendo do ponto de vista, a minha análise é um mega clichê.



Estou cansado desta falsa crítica. Digo falsa porque a crítica (pelo menos em perspectiva científica) se propõe a ressaltar aquilo que há de positivo e negativo numa dada realidade. E se a crítica surge do âmbito da Teologia Pastoral, ela, além de observar as questões anteriores, ousa apresentar sugestões para desenvolver o que está bem e corrigir aquilo que está mal.



Enfim, até a expressão “estou cansado de tal coisa no cristianismo” é clichê.



Que Deus liberte a arte enclausurada no artigo “Arte e libertação”! Que o Senhor ajude o escritor do artigo a apresentar ideias perigosas com maior precisão, fundamentação e amor pelos/as leitores/as.



Graça, paz e bem!




Arte e Libertação

Ano passado, comentei com o pastor da minha igreja que achava que as letras das músicas cantadas nos cultos evangélicos brasileiros careciam muito de boa poesia. Ele então me incentivou a escrever um artigo sobre o assunto.

Cresci tocando em igrejas. Depois comecei a pensar nos porquês e finalidades da música na igreja. E depois comecei a pensar nos porquês e finalidades da igreja. E depois comecei a pensar em Deus. Recorri à Teologia como autodidata. Enquanto conversava com a senhora Teologia, deixei a senhora Música esperando. Quando disse a um amigo crente que estava gastando tempo com a Teologia, ele foi sincero recomendando que eu investisse tempo na Culinária ao invés, pois, de acordo com ele, me seria muito mais útil. Mas não consigo parar de pensar nesses assuntos (Este mesmo amigo chama nossa pequena tchurma às vezes de "crentes-cara-de-pau").

A música, juntamente com outros elementos tradicionais da liturgia, como a pregação, faz uso da linguagem para expressar sentido. Tenho, contudo, um problema com a música nas igrejas evangélicas: a sua linguagem me soa como clichês derivados de clichês. Um léxico cíclico entediante. Cheguei à conclusão que o que esvaziou as letras das músicas de sentido foi a falta de interação externa. Sim, o problema é teológico: não esperava nada menos da igreja que estar completamente inserida no mundo, assim como Jesus se encarnou. Esperava que as linguagens encontradas em igrejas fossem as mesmas das culturas nas quais estivessem embutidas.

Uma vez em Brasília fui visitar a Torre de TV, onde há várias barracas de comércio informal. Em um ou dois cantos havia rodas de samba. E no centro do comércio havia um grupo de jovens crentes "evangelizando", isto é, cantando músicas-de-crente. Pareciam ETs. Por que esses jovens não estavam nas rodas de samba? Por exemplo, ouvi um compositor cristão pós-graduado em Letras – pouco cantado nas liturgias das igrejas evangélicas - que baseou sua música no Salmo 73. É muito louvável a iniciativa de se cantar os Salmos. Contudo, a letra espiritualizada passava longe do problema de distribuição de renda no Brasil. Quando é que vamos desempacotar a pergunta "quem é Deus para o brasileiro?" em bom Português?

Cheguei também à conclusão que muitas vezes a música é abusada por líderes evangélicos para centralizar a experiência cristã no culto e para blindar a linguagem. Será que esse é o caso da sua igreja atual? Senão vejamos: pergunte à liderança da sua igreja por que outras artes como a escultura, a pintura, o teatro, o cinema, a literatura não têm o mesmo espaço que a música.

Nos evangelhos, vejo Jesus comendo freqüentemente com as "pessoas erradas" (Mateus 22.10; Lucas 5.29; 7.34-39; 14.13; 19.7). Jesus constantemente traz para perto de seu convívio "os de fora". E o faz não só comendo, como curando e convivendo. Aliás, essa é uma leitura que vejo permear as Escrituras inteiras. Inúmeros teólogos sublinham a presença de Deus no outro. O Rabino-Chefe da Grã-Bretanha, professor Sir Jonathan Sacks, por exemplo, na entrevista do show Being da NPR desloca a revelação para o outro citando vários exemplos: a filha de Faraó no Êxodo, filha do vilão, salva o mocinho; enquanto vários profetas israelistas pregam e o povo de Israel não dá ouvidos, Deus manda um profeta – Jonas – aos assírios, inimigos históricos dos israelitas, e depois de uma curtíssima pregação de Jonas de 5 palavras todos se arrependem. Se um amigo seu lhe perguntasse "o que devo fazer para conseguir a vida eterna?", o que você responderia? Ao ser perguntado, Jesus responde contando a parábola do Bom Samaritano. Nela, o herói citado por Jesus que responde à pergunta sobre salvação é o samaritano herege (note que o samaritano nem fala nada com o homem ferido).

Ainda em Mateus 25, ao falar sobre o julgamento final e a recepção do Reino eterno, Jesus está escondido no outro, o outro sofredor (pense um pouco no critério usado para ir para o lado direito).

A Cristandade vista como um período histórico em que o Cristianismo esteve imbricado com a vida pública se foi de acordo com uns ou está indo de acordo com outros. Nossos dogmas, afirmações e identidades religiosas outrora baseados na Cristandade de repente não se justificam por si sós. Muitos de nossos "conceitos fundamentais" nada mais foram do que construções sociais. Jorge Luis Borges diz que em uma enciclopédia chinesa os animais do mundo são classificados assim: pertencentes ao imperador, embalsamados, domesticados, leitões, sereias, fabulosos, cães em liberdade, incluídos na presente classificação, que se agitam como loucos, inumeráveis, desenhados com um pincel muito fino de pêlo de camelo, et cetera, que acabam de quebrar o vaso e que de longe parecem moscas. Necessitamos, portanto, de novas linguagens e de novas práticas que façam algum sentido hoje. Mesmo que o leitor não concorde que nossos dogmas, afirmações e identidades religiosas não se justificam por si só nos dias de hoje, seria necessário neste caso no mínimo um exercício de recontextualização e revalidação da linguagem evangélica atual.

(Tenho pensado sobre Bonhoeffer. Claro que você não vai ouvir falar muito de Bonhoeffer na sua igreja. Que pastor iria querer dar esse tiro no pé?) Vejamos: "tanto Vattimo como Bonhoeffer entendem a secularização como um fenômeno intrínseco ao Ocidente cristão. Segundo Bonhoeffer, o processo de secularização, ‘a cuja etapa final hoje assistimos’, é um processo de libertação da razão que se intensifica com a Reforma, ao desdivinizar o mundo [...]" (Meu comentário: o tiro no pé dos Protestantes). "O ser humano aprendeu a dar conta de si mesmo em todas as questões importantes sem apelar para a ‘hipótese de trabalho [de] Deus’", diz Bonhoeffer’ no livro Resistência e Submissão (D. Bonhoeffer, Resistência e submissão, 2003, p. 434). "[Q]uanto mais a religião se coloca contra esse processo de secularização, mais tal processo se compreende como anticristão, afastando ainda mais o cristianismo da sociedade." "Discutindo o papel da religião no mundo secularizado, Bonhoeffer chega a questionar o valor das palavras – num mundo arreligioso talvez não se possa mais ‘falar de Deus’."

Nos últimos anos fui algumas vezes ao Festival Grego onde moro, em Ottawa, no Canadá. O lugar tem duas partes: o templo da Igreja Ortodoxa Grega e a área da festa, com tendas, mesas, comidas, vendinhas, brinquedos para crianças e uma área ampla para danças. A igreja estava a maior parte do tempo vazia. A área de festa estava a maior parte do tempo lotada. Tudo acontecia na área de festa. O templo só tinha pessoas no tour guiado ao seu interior e eram sempre poucas. Sim, não deve haver divisão entre sagrado e profano (Marcos 15.38, Atos 10.15). Nossas vidas não são compartimentalizadas. Não somos menos santos às segundas-feiras. Afinal, não é Deus onipresente? Enquanto alguns poucos evangélicos até concordam com o princípio de que não deve haver divisão entre santo e profano, na prática os evangélicos estão longe de demonstrar práticas que assumam ou desenvolvam ou explorem tal ideia.

"Nossa igreja, que nestes anos lutou apenas pela sua própria preservação, como se fosse um fim em si mesma, é incapaz de ser portadora da palavra reconciliadora e redentora para os seres humanos e para o mundo. Por isso, as palavras anteriores têm de perder a força e ficar mudas, e nossa existência cristã consistirá hoje apenas em duas coisas: em orar e praticar o que é justo entre as pessoas. Qualquer pensar, falar e organizar as coisas do cristianismo tem de renascer desse orar e praticar." (D. Bonhoeffer, Resistência e Submissão, 2003, p. 397)

"O que me ocupa incessantemente é a questão: o que é o cristianismo ou ainda quem é de fato Cristo para nós hoje. Foi-se o tempo em que se podia dizer isso para as pessoas por meio de palavras – sejam teológicas ou piedosas; passou igualmente o tempo da interioridade e da consciência moral, ou seja, o tempo da religião de maneira geral. Rumamos para uma época totalmente arreligiosa; as pessoas, sendo como são, simplesmente não conseguem mais ser religiosas. [...] toda a nossa pregação e teologia cristãs de 1.900 anos baseiam-se no a priori religioso das pessoas. O ‘cristianismo’ sempre foi uma forma (talvez a verdadeira) da ‘religião’. Ora, se um dia evidenciar-se que esse a priori nem existe, mas foi uma forma de expressão historicamente condicionada e passageira do ser humano, se, portanto, as pessoas tornarem-se radicalmente arreligiosas – e acredito que em maior ou menor grau esse já seja o caso – então o que isso significa para o ‘cristianismo’? Tiram-se as bases de todo o nosso ‘cristianismo’, da maneira como existiu até agora [...]" (Bonhoeffer, carta a Eberhard Bethge em 30/4/1944 in "Resistência e Submissão: Cartas e Anotações Escritas na Prisão")

"Não é de nossa alçada prever o dia – mas esse dia virá – no qual as pessoas serão novamente vocacionadas para expressar a palavra de Deus de tal maneira que o mundo seja transformado e renovado por ela. Será uma nova linguagem, talvez totalmente arreligiosa, mas libertadora e redentora como a linguagem de Jesus..." (D. Bonhoeffer, Resistência e Submissão, 2003, p. 397, grifo meu)

Há muito mais coisas acontecendo fora do templo. Há muito mais vida. (João 10.10) Contudo, a linguagem utilizada pelos crentes hoje só faz sentido dentro do templo (ou provem-me o contrário). Não creio que nossos esforços devam ser na direção de levar a festa para dentro do templo, mas de identificar o divino na festa (Lucas 17.21, João 2.2) Sabemos que cantamos o que acreditamos e acreditamos no que cantamos. O nada-dizer ou o dizer-confuso leva, em certa medida, as práticas das igrejas locais a serem também ou nada ou confusas. Não só isso, mas o fazer-nada de muitas igrejas, disfarçado de ativismo, requer músicas que não falem nada. Que muro é esse que separa a religião de todo o resto da vida? Sim, este muro impede que a complexidade, a beleza e o caos da vida questionem ou ameacem o que cremos. Pois o que cremos, por definição, é aquilo que não deve ser questionado, não é?

Pois a liturgia é também um processo de formação e modelagem de subjetividades a longo prazo. A teologia influencia a liturgia, mas não devemos subestimar o vice-versa.

"[Para além da cristandade,] há uma religião verdadeiramente cristã, sem dogmas (Deus, o chamamos pai, mas podemos também chamá-lo mãe; os padres são homens, mas poderiam ser também mulheres), fundada na fé e na esperança de que com a caridade se realiza verdadeiramente o reino de Deus, começando por este mundo. [...] O verdadeiro ecumenismo cristão se realizará quando o próprio cristianismo compreender que deve abater as barreiras que ele mesmo criou – e que o pontificado atual parece querer cada vez mais solidificar: aqui nós, cristãos, lá, o Islã malvado; aqui os normais, lá, os gays e os diferentes. A tarefa dos cristãos não é converter os outros e fazê-los tornarem-se como nós; mas começar a liquidar a própria (pretensão de) identidade, para acolher a todos." (Vattimo, "O cristianismo e a ultramodernidade", IHU on-line)

Prince também ficou preso por um tempo ao seu próprio nome. Reconhecendo que contratos comerciais aprisionaram seu nome, Prince criou um novo nome para si, representado apenas pelo símbolo (inpronunciável).

Precisamos de artistas que andem e convivam imersos na cultura, sem limites, sem falsas divisões entre sagrado e profano.

Precisamos de artistas que desenvolvam novas linguagens, compreendendo este exercício como um exercício que caminhe a Teologia. Aconselho a andar principalmente com teólogos atuais mentes-abertas, pois do contrário corre-se o risco de herdar vícios de linguagens e de práticas (Marcos 2.22). Nesse exercício a confecção de novas linguagens deve envolver "os de fora" (sabendo que "os de fora" é uma ilusão, pois não há divisão entre "nós" e "eles").

Precisamos desconstruir a "identidade cristã", redefinindo nossas várias identidades executando práticas reconfiguradoras e libertadoras (de Jesus).

Precisamos explorar a noção da morte de Deus (na cruz) e dos paradoxos da morte das identidades (1 Cor 15.36)

Precisamos resgatar a Eucaristia, explorando o Corpo místico de Jesus. Precisamos integrar a Eucaristia com o cotidiano e com nossas lutas sociais.

Precisamos explorar a epistemologia com muita arte. Precisamos desenvolver uma sensibilidade ao que está ao nosso redor com uma alteridade radical. No nosso tempo, muito do que é visto como "real" são percepções muito deturpadas. Desejos e subjetividades são moldados pelo marketing forte. Não faz sentido sapatos serem vendidos a R$ 400,00 nos shoppings. O que norteia nossa noção de "valor"? Por que coisificamos tudo? Quais são as implicações para nossas práticas de alteridade?

Precisamos lembrar que o meio é a mensagem.

Precisamos recriar símbolos, mitos, metáforas e ritos, associando práticas de alteridade radical a elas. Não só no campo da cultura, mas também nos campos da política e economia.

Juntamente com a exploração da epistemologia, precisamos redescobrir o corpo humano (Luc 22.19).

Juntamente com a redescoberta do corpo humano, precisamos subverter os limites do moralismo farisaico e doentio. Precisamos ouvir e tocar mais Cazuza e Vinícius de Moraes. Precisamos de ritos de catarse.

Juntamente com a exploração da epistemologia, precisamos abraçar o caos da vida. Precisamos identificar nossos pequenos e grandes fracassos. Precisamos de uma boa dose de pessimismo. Precisamos resgatar o livro de Eclesiastes. Precisamos reconhecer as fés que falham. Precisamos dar lugar à dúvida. Precisamos de espelhos. Precisamos estar sempre juntos daqueles que sofrem perto de nós. E no Brasil são muitos.

Devemos usar tecnologia com sabedoria, evitando elitizar a comunidade e evitando a exclusão dos milhões que sofrem no Brasil.

Precisamos rejeitar o gueto, a subcultura e a massificação evangélica, identificando-os mais explicitamente como práticas pecaminosas. Precisamos identificar e nomear o sequestro e o abuso das artes por líderes e pelos sistemas (capitalistas, hierárquicos, machistas, excludentes, racistas, elitistas, etc) para fins pecaminosos. Não fazê-lo é ser cúmplice.

Precisamos criar Comunidades Humanas de Base.

Nessas Comunidades Humanas de Base, precisamos experimentar várias ideias de "liturgia". Por exemplo, guardarei comigo duas lembranças de Brasília para sempre de Eucaristia.

A primeira experiência foi quando estive numa reunião do Comitê do DF da Campanha Pelo Limite da Propriedade da Terra para organizar o plebiscito popular em 2010. Éramos motivados e estávamos re-unidos ali pela dignidade humana. Compartilhávamos bolachas e café enquanto discutíamos os problemas seculares do Brasil relacionados à distribuição de terra e enquanto planejávamos ações práticas.

A segunda experiência foi minha caminhada com a comunidade do Núcleo Rural Monjolo ao longo de 2009 e 2010 (Assista no Youtube ao documentário "Monjolo: Todo Mundo Tá Feliz?" que eu produzi sobre a história dessa comunidade). Resumidamente, o Núcleo Rural Monjolo é formado majoritariamente de famílias que subsistiam de reciclagem do lixão de Brasília e que foram removidas à força de suas casas para o meio do nada pelo Governo do Distrito Federal. Tive o privilégio de caminhar com algumas dessas famílias e apoiá-los nas suas várias necessidades. Ali coabitam evangélicos, católicos, espíritas, ateus e sem-religião. Ali política é algo muito prático: determina se terão moradia e pão na mesa ou não (sendo o "não" um caso frequente). Embora não tenhamos tido tempo de elaborar mais profundamente algumas das sugestões desse texto, guardarei comigo as imagens únicas das repetidas vezes quando várias famílias se reuniram para comer, tocar música, declamar poesia, discutir os problemas da comunidade e falar de ações políticas.

Uma das cenas finais do filme do Bob Esponja mostra-o fazendo um solo de guitarra vestido de mágico. O raio que sai da sua guitarra destrói os capacetes que controlavam os indivíduos, libertando-os. Gosto dessa metáfora. Gosto de pensar na arte como agente no processo de libertação.

" (...) Fora da poesia, não há salvação.A poesia é dança e a dança é alegria. Dança, pois, teu desespero, dança

Tua miséria, teus arrebatamentos,

Teus júbilos

E, Mesmo que temas imensamente a Deus,

Dança como David diante da Arca da Aliança.

Mesmo que temas imensamente a morte

Dança diante de tua cova.

Tece coroas de rimas…

Enquanto o poema não termina

A rima é como uma esperança

Que eternamente se renova. (...)" - Mário Quintana